Riscos do mercado financeiro: quais são as lições do caso Gamestop
A Gamestop (GME), tradicional rede varejista de games, se tornou destaque do mercado acionário nos Estados Unidos neste ano. A ação da empresa disparou de US$ 19,26, em 12 de janeiro deste ano, para expressivos US$ 380 na máxima registrada na Bolsa de Nova York (Nyse), em 27 de janeiro – uma alta de mais de 1.800%. No dia seguinte, porém, os papéis da Gamestop caíram mais de 60% nas mínimas do dia — quando a negociação do papel foi interrompida.
Mas, afinal, o que explica essa valorização enorme em um curto espaço de tempo? Com um recuo acumulado em torno de US$ 1 bilhão em receitas no período entre 2008 e 2020 – apesar do crescimento da indústria de games -, a empresa não apresentava muitos atrativos para investidores. No terceiro trimestre fiscal de 2020, a GameStop divulgou queda de 30% nas vendas líquidas na comparação com o mesmo período de 2019. As vendas digitais subiram 257%, mas totalizavam ainda apenas 25% de tudo o que era comercializado pela companhia.
Num mundo cada vez mais digital como o nosso, você deve achar estranho que uma empresa cujos negócios são majoritariamente baseados em lojas físicas -, e também na venda de produtos físicos -, possa causar tanto alvoroço. Mas foi o que aconteceu e a participação de usuários de uma comunidade do Reddit foi decisiva para esse feito histórico. Especuladores viram na Gamestop a chance de espremer e lucrar e, também, de confundir e contra-atacar os gigantes do mercado e, claro, lucrar no processo..
Squeeze nos grandes fundos
Quando os gestores de grandes fundos não acreditam no futuro de uma empresa, o que eles fazem? Se posicionam “vendidos” nas ações, o que é chamado de short sell. Neste texto explicamos como traders do mercado especulativo buscam lucros com esse tipo de operação).
O problema de operar vendido é que se o preço das ações subirem demais, você perde. E foi aí que um grupo de nerds do Reddit – fórum online -, o Wall Street Bets deu um golpe de mestre em hedge funds milionários: se organizaram para comprar ações da Gamestop e subir artificialmente, trazendo prejuízos para os fundos.
Quando vários aplicadores compram coordenadamente ações de uma companhia para valorizar os papéis rapidamente e, assim, levar prejuízo a quem apostou na queda dessa mesma ação, essa operação se chama short squeeze.
O movimento foi tão grande que a Gamestop chegou a ter a ação mais negociada no mundo, com volume de 20 bilhões de dólares, no dia 26 de janeiro, à frente de gigantes como a Apple e a Tesla. No dia seguinte, o bilionário Elon Musk, CEO da Tesla Motors, publicou em sua conta no Twitter a mensagem “Gamestonk!” com um link que redireciona ao fórum onde o motim de pequenos investidores começou. Isso foi o suficiente para alavancar ainda mais o preço das ações da companhia.
Como o sistema americano reagiu
Nos EUA, a “brincadeira” trouxe sérias consequências para profissionais no ramo das ações. O fundo de hedge – cobertura de investimentos de risco – da Melvin Capital Management, por exemplo, foi duramente atingido pela disparada de preços da ação da Gamestop, contra a qual ela apostava, perdendo 53% de seu valor em janeiro. Em 30 dias, a Melvin Capital, que iniciou o ano com cerca de US$ 12,5 bilhões sob gestão, chegou a perder US$ 4 bilhões no período.
O caso chegou ao Congresso americano em meados de fevereiro. Parlamentares queriam discutir a legalidade do movimento e reguladores exigiam uma explicação. Keith Gill, famoso no Reddit e no YouTube por suas análises sobre a GameStop, foi um dos depoentes. O co-fundador do Reddit, Steve Huffman, e Vlad Tenev, chefe do aplicativo de corretagem Robinhood – corretora onde as negociações coletivas e sem comissão começaram -, também foram ouvidos.
Por enquanto, nenhum investidor foi judicialmente responsabilizado pelo boom especulativo e não existe previsão de novas audiências sobre o caso no Comitê de Serviços Financeiros da Câmara dos EUA.
Desde então, as ações da Gamestop estão sofrendo grande volatilidade. Em fevereiro, os papéis desvalorizaram até U$ 40 e voltaram a subir a US 220. No dia 03 de maio, os papéis terminaram o pregão cotados em US$ 162.
Analistas de Wall Street acreditam que não demorará para os papéis da empresa voltem a cair aos patamares de antes. Isso porque o valor das ações e o valor real da empresa ainda estão “descolados” por conta do squeeze (os papéis estão valorizados por oferta e procura e não pelo valor de fato da empresa). Segundo eles, o ajuste será natural. Inclusive, diversos fundos já voltaram a se posicionar vendidos nos papéis da empresa – afinal, o mercado não para. O caso, porém, se tornou emblemático e ganhou a atenção de Washington e o governo Biden já afirmou que aumentará a “vigilância” sobre o mercado por meio da SEC – Securities and Exchange Commission, a CVM americana.
No Brasil, CVM afirmou estar atenta a ações parecidas
Quando vários aplicadores compram coordenadamente ações de uma companhia para valorizar os papéis rapidamente e, assim, levar prejuízo a quem apostou na queda dessa mesma ação, essa operação se chama short squeeze. No Brasil, pequenos investidores tentaram reproduzir essa tática na B3, a bolsa de valores brasileira, combinando pelas redes sociais de influenciar o preço das ações da resseguradora IRB Brasil, que chegaram a subir 14%, mas nada perto do que se viu no caso Gamestop.
A CVM (Comissão de Valores Imobiliários), então, alertou no dia 29 de janeiro, que “a atuação com o objetivo deliberado de influir no regular funcionamento do mercado pode caracterizar ilícitos administrativos e penais” e que “monitora continuamente o mercado para identificar práticas ilícitas”.
Segundo a Comissão, o squeeze é uma modalidade de manipulação em que operadores combinam uma operação com a intenção de prejudicar outros investidores, criando um preço artificial. Dificilmente um caso como esse teria sucesso no Brasil, o que pode tranquilizar investidores, pois o mercado acionário aqui dispõe de ferramentas para frear oscilações atípicas ou manipulação, como o circuit breaker – interrupção das operações quando há quedas bruscas. Segundo a CVM, também há limitação de volume de ações que se pode vender a descoberto.
Por isso, contar com uma gestão profissional é uma escolha inteligente para a sua carteira de investimentos. Quer investir no mercado de ações com fundos geridos por profissionais experientes? Venha conhecer o fundo Ouro Preto Ações FIA